A INCLUSÃO DIGITAL
Estamos
caminhando para uma nova fase de convergência e integração das mídias:
tudo começa a integrar-se, a falar com tudo e com todos. Tudo pode ser
divulgado em alguma mídia. Todos podem ser produtores e consumidores de
informação. A digitalização traz a multiplicação de possibilidades de
escolha, de interação. A mobilidade e a virtualização nos libertam dos
espaços e tempos rígidos, previsíveis, determinados. O mundo físico se
reproduz em plataformas digitais e todos os serviços começam a ter a
possibilidade de serem realizados física ou virtualmente. Há um diálogo
crescente, muito novo e rico, entre o mundo físico e o chamado mundo
digital, com suas múltiplas atividades de pesquisa, lazer, de
relacionamento e outros serviços. além disso, há possibilidades de
integração entre ambos que impactam profudamente na educação escolar e
nas formas de ensinar e aprender a que estamos habituados.
O
problema do Brasil não é principalmente tecnológico, mas de
dedigualdade estrutural. O mercado não resolve a desigualdade social,
não inclui os mais pobres. As tecnologias não chegam a todos por igual.
Por isso são importantes as políticas públicas de inclusão. O programa
governamental de um computador por aluno propõe a que todas as escolas
públicas, nos próximos anos, estejam plenamente conectadas com redes sem
fio e que todos os professores e alunos tenham seu computador pessoal.
Junto com isso haverá capacitação para que os professores transformem as
aulas em atividades de pesquisa e de colaboração, para que sejam
mediadores mais do que informadores. Só as tecnologias não mudam a
educação, mas elas são importantes para flexibilizar o currículo, as
metodologias, para focar mais a aprendizagem e o aluno do que o ensino
convencional.
Além
da inclusão digital precisamos da inclusão afetiva e também da ética.
Na primeira, acolhem-se os alunos, valorizando-os, dando-lhes força,
esperança, entusiasmo. Alunos motivados vão mais longe, caminham com
mais autonomia. A afetividade é um componente fundamental pedagógico e
contribui decisivamente para o sucesso pessoal e grupal. Na segunda,
como vivemos em uma sociedade que valoriza muito a aparência - no
sentido corporal e na representação de papéis - é necessário termos
educadores que mostrem coerência entre o que ensinam e praticam, que se
apresentem como seres em crescimento, com contradições, com acolhimento e
incentivo. Num mundo de tanto "faz de conta", de tantas aparências e de
tantas mentiras, educar dentro da verdade e da coerência já é uma
grande inovação. A preocupação excessiva com a aparência, seja física ou
social, mostra a dificuldade de mudar valores que nos ajudariam a
crescer mais, porém que contrariam interesses, negócios. O glamour que
atribuímos a qualquer pessoa só pelo fato de aparecer na televisão
mostra quanto a educação ainda precisa avançar.
A
educação tem um papel político fundamental: mostrar a todos que podemos
mudar esse estado de coisas que está aí, essa banalização das
aparências, do consumo, da mentira e da enganação descarada de muitos
grupos, que dificulta sobremaneira a credibilidade das propostas
educativas cidadãs.
As
tecnologias não são o centro da mudança educacional, mas estamos num
período fundamental de inclusão de todos no processo de ensino e
aprendizagem: gestores, professores, alunos, funcionários e comunidade.
As tecnologias evoluem muito mais rapidamente do que a cultura. Esta
implica em padrões, repetição, consolidação e a cultura educacional,
também. As tecnologias permitem mudanças que praticamente permanecem
inexploradas pela inércia da cultura tradicional, pelo medo, pelos
valores consolidados. Por isso sempre haverá um distanciamento entre as
possibilidades e a realidade. O ser humano avança com inúmeras
contradições, muito mais devagar do que os costumes, hábitos, valores.
Intelectualmente também avançamos muito mais do que nas práticas. Há
sempre um distanciamento grande entre o desejo e a ação. Apesar de tudo,
está se construindo uma outra sociedade, que em uma ou duas décadas
será muito diferente da que vivemos até agora.
Mesmo
com tecnologias de ponta, ainda temos grandes dificuldades no
gerenciamento das emoções, tanto no aspecto pessoal como no
organizacional, o que dificulta o aprendizado rápido. As mudanças na
educação dependem, mais do que das novas tecnologias, de termos
educadores, gestores e alunos maduros intelectualmente, emocionalmente e
eticamente. Pessoas curiosas, interessantes, entusiasmadas, abertas e
confiáveis, que saibam motivar e dialogar; pessoas com as quais valha a
pena entrar em contato, porque dele sempre saímos enriquecidos. E isso
não depende só de tecnologias, mas de programas estruturais que
valorizem os educadores na formação e no exercício efetivo da profissão,
com condições dignas, fazendo com que eles se sintam importantes. As
tecnologias são parte de um processo muito mais rico e complexo, que é
gostar de aprender e de ajudar a outros que aprendam numa sociedade em
profunda transformação.
Quanto mais tecnologias avançadas, mais a educação precisa de pessoas humanas, evoluídas, competentes, éticas.
São muitas informações, visões, novidades. A sociedade torna-se cada
vez mais complexa, pluralista e exige pessoas abertas, criativas,
inovadoras, confiáveis. O que faz a diferença no avanço dos países é a
qualificação das pessoas. Encontraremos na educação novos caminhos de
integração do humano e do tecnológico; do racional, sensorial, emocional
e do ético; do presencial e do virtual; da escola, do trabalho e da
vida em todas as suas dimensões.
Reportagem de JOSÉ MANUEL MORAN, Professor de Novas Tecnologias na USP;
Diretor Acadêmico da Faculdade Sumaré-SP.
Fonte: REVISTA APRENDIZAGEM
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